– Aquele carro ali. – aponto ao
carro ali. – Eu sempre quis ter esse carro. Não
sei a que intuito sirva um carro, mas sei que eu acho que eu um dia quis ter
esse treco aí. Tive oportunidade
de trabalhar bastante pra juntar o montante de unidades monetárias necessário
para adquiri-lo, mas eu não dei valor para as possibilidades da vida. –
converso comigo mesmo. – Que pena. Cansei de conversar sozinho.
Ando pela
rua de asfalto despedaçado pelo verde, o Sol escaldante torrando minha nuca.
Tudo é tão silencioso que nem sei descrever direito. Falta dinamismo, eu acho.
Nunca usei essa palavra, “dinamismo”, na vida. Parabéns pra mim.
Pego um
pedaço de pau qualquer por aí e o balanço, gastando energia inutilmente.
Energia é um bem precioso hoje em dia, pois todas as coisas fáceis de comer
estão podres. Mas, sei lá, não tem muita coisa a se fazer, então qualquer coisa
que gaste energia é bem vinda. Nem sei por que insisto em continuar vivendo,
também. Tudo é tão chato.
Fico
pensando bastante, porque não há muito a fazer. Fazer coisas não tem graça, sei
lá por que. Talvez o sentido da vida no passado fosse realizar ações para os
outros verem, sentirem com suas sensações organolépticas e responderem com
reações. A vida podia muito bem ter sido apenas uma causalidade de eventos,
onde eu faço isso e o outro faz aquilo em resposta a isso que eu fiz. Mas o que
são “os outros”? Ué. Já nem sei mais o que estou pensando. Deve ser esse Sol na
nuca que frita meus miolos. Nada faz sentido.
–
Vá se foder. – digo, sem entusiasmo, e arremesso o pedaço de madeira.
Até
morrer não faz sentido. Comer também não faz sentido, mas a fome dói. Por falar
nisso, preciso caçar a janta antes que escureça. Eu bem que poderia não ter
arremessado aquele pedaço de pau pra longe. Teria sido uma ferramenta
conveniente. Devo estar ficando inconsequente, agora que não existe coisa alguma
para me julgar e retrucar na minha cara o quão errado o que eu faço é. Cara, eu
já nem sei por que estou filosofando, ou se o que filosofo todo dia tem alguma
lógica. Pra que serve a minha filosofia se não há outro para rebater com argumentos
e tentar, junto comigo, desbravar teoricamente a vida? Filosofo porque tenho
que exercitar a comunicação e não esquecer que as palavras um dia existiram e
foram úteis. Quero preservar o legado de algo que ainda reside em mim, por
algum motivo, mesmo que eu não tenha esperanças de que isso venha a ter
serventia no futuro.
–
Algum animal aí quer ser comido? – grito, fazendo concha com as mãos. Meu
timbre bate e rebate nas ruínas da sociedade, entrando e saindo de edifícios
sujos e rachados pelas intempéries. – Quem quiser levante a mão. – complemento.
– Digo... Levante a pata! – corrijo-me, a troco de nada. – Levante a mão só se
for um macaco, tudo bem?!
Será mesmo
que não tenho mais esperanças? Acho que tenho sim. Que legal, estou mentindo
pra mim mesmo, e ainda por cima estou confuso. Não sei mais o que eu quero, e
não se o que se passa pela minha cabeça é verossímil, porque não há nada que me
diga que estou errado. Logo, tudo o que eu falar é lei. Sou a verdade. Tudo o
que eu fizer está certo. Acho que foram só esses tais de “outros” sumirem do
mundo que todos os conflitos cessaram e tudo o que existe se unificou em mim.
Eu sou o rei dessa porcaria toda. Monopolizo toda essa bosta e bosta nenhuma ao
mesmo tempo.
Meu Deus,
eu só penso merda.
– E só falo
merda, também. – digo a um coelho que come grama.
Que Deus?
O coelho não é
arisco. Isso significa que ele não me vê como ameaça. Nem sei por que eu me
importo com isso. Mesmo assim, dou um chute nele e o faço voar pra longe.
– Por que está
me tratando com indiferença, seu verme? – aponto pra ele. Corro atrás dele e
piso em sua cabeça insignificante. – A única coisa que ainda faz sentido é
sentir dor, e mesmo a dor eu tento evitar, porque eu quero comer.
Hoje em dia, o
instinto se tornou obsoleto. Pra que sobreviver? O instinto é uma
inconveniência. Talvez eu inconscientemente preserve o instinto para não me
esquecer de como ele é. Algum motivo me diz sem realmente dizer para eu
preservar o que ainda há dentro de mim. Ou talvez eu só pense demais, mesmo.
– Trá lá lá,
que vontade de chorar! – entoo, numa melodia improvisada. – Tré lé lé,
estou vivo e em pé! – deposito o cadáver
do coelho por cima do ombro e retomo minha caminhada solitária sem rumo. – Tró
ló ló, quanto pó nesses prédios. – preciso cantar para preservar a musicalidade
desse planeta. – Tri li... Vixe... – dou passos, e com a mão no queixo e cenho
franzido fico bem pensativo. – Estou esquecendo a ordem das vogais. E estou
esquecendo como rimar.
– Eu também.
Paro de andar.
Alguma coisa
esquisita quer sair do meu peito. É uma dor? O que foi isso?
– O que foi
isso? – pergunto.
– O que o quê?
– alguma coisa acontece em alguma direção.
– Isso não é
um eco. – afirmo. – O que foi isso? – giro a todos os lados, com a coisa dentro
do meu peito acelerada e respiração esquisita.
– É uma voz. –
a voz responde, agora emanando pela direita. – Uma voz feminina. – viro pra
direita.
Fico em
silêncio por um tempo tentando compreender o troço direito. O mato alto na
minha frente começa a se mexer de um jeito que o vento não faria. Só ouço esse
barulho de grama. Aliás, minhas orelhas estão esquisitas, porque fica um
negócio dentro delas pressionando eu por dentro e fazendo “tum tum, tum tum”.
Não lembro o que é, mas tenho a sensação de que algum dia eu já tive essa
sensação. Inclusive, faz tempo que eu não tinha sensação nenhuma além do tédio.
Estou me desconhecendo.
– O que você
está sentindo? – a voz, agora mais alta, pergunta. – Nossa, que mato alto. – o
mato diz, se agitando mais perto de mim.
– Ué. – coço a
nuca. O Sol está na minha testa. – Sei lá. Acho que fome. Só que nunca senti
fome no peito.
– Credo. – a
voz do mato responde. – E você, o que está sentindo? Digo... E eu? Digo... – o
mato para de se balançar. – Estou tão acostumada a falar sozinha que nem sei
mais falar.
Silêncio.
O mato volta a
se mexer. Coço a orelha e troco o coelho de ombro. Minha garganta também pulsa,
assim como o resto do meu organismo. Estou com uma tremedeira estranha, a qual
aumenta na medida em que o mato vai se abrindo mais perto. Bocejo. Por quê?
Um ser bípede
sai de dentro do mato, vestindo um maltrapilho que nem eu. O ser para onde está
e ficamos uns dois minutos nos averiguando visualmente, mantendo a distância.
Sinto algo que não sentia faz tempo, e acho que era a curiosidade. Ainda estou
tremendo, mas parece que é bom, mesmo que seja ruim e que debilite as fundações
da minha força mecânica. Verifico que a criatura possui dois pés, duas mãos,
dois braços, duas pernas, uma cabeça, cabelo longo, dois olhos, e tudo mais
igual a mim. Igual não, parecido.
– Você, por
acaso, é um ser humano? – pergunto, rompendo o silêncio. O que é isso que eu
acabei de falar?
– Decerto. –
responde, um som doce sai de seus lábios. Acho que isso se chama “sinestesia”.
– Uma ser humana. Sou um espécime fêmeo. Eu acho. – seu rosto se avermelha.
Humano? O que
é isso?
– Seu rosto
está vermelho. – aponto pras suas bochechas encardidas.
Ela põe as
mãos no rosto, como se com o tato pudesse verificar as cores. Na verdade, ela
pôs as mãos pequeninas na frente do rosto para escondê-lo de mim. Sei lá por
que fez isso, mas nada faz sentido mesmo, então tanto faz. Ou será que faz
sentido?
Ando sem
querer para perto dela, enquanto ela ainda está com a face coberta. É uma ação
involuntária essa minha. Paro bem perto dela, frente a frente, e desprezo o
coelho sem graça e sem cabeça no asfalto partido. De repente começo a recordar
uma miríade de coisas do passado. Palavras, significados, conceitos, histórias,
etecetera.
– Qual é o seu
nome? – pergunto, de cabeça baixa, porque ela é baixinha.
A mulher
permanece parada por alguns segundos, com a cabeça baixa, porque não sei por
que. Vagarosamente baixa as mãos e em seguida levanta a cabeça para encontrar
meus olhos. No momento em que nos achamos eu tenho um espasmo nada a ver no meu
corpo, como uma onda de sensações ao mesmo tempo novas e velhas que incidem
todas ao mesmo tempo nas minhas tripas.
– Eu não
lembro. – ela responde. – Ué. – morde os próprios lábios. – Qual é o seu nome?
– Eita. –
respondo. – Sei lá.
Ficamos nos
encarando por mais um tempo esquisito. O Sol está se pondo. Parece que não sou
o último ser humano existente.
– Por que será
que eu não te reconheci como um ser humano, também? – pergunto, intrigado. –
Ser humano... O que é isso? Por que eu pensei nisso?
Nem sei por
que foi que eu assumi tão de prontidão que realmente sou um dito “ser humano”.
– Perguntas
difíceis. Não consigo pensar direito. – diz, pensando forte. – Estranho, eu
sempre tenho várias palavras na cabeça e de repente, agora, sumiram. – olha
para o lado.
Por um momento
eu sigo a linha do seu olhar e olho pra trás de mim. Não acho nada de
interessa, fico confuso tentando entender o que é que ela estava olhando de tão
peculiar, mas daí me lembro de que isso é a “linguagem corporal” que antes
havia quando haviam várias pessoas vivas. Na verdade ela não está olhando a
nenhum lugar em específico, mas está tentando se lembrar de alguma coisa
importante. Inconscientemente as pessoas faziam isso quando elas queriam se
lembrar de alguma coisa importante: olhavam para o nada. Será que o nada tem
alguma coisa interessante para nos dizer? Sei lá o que estou pensando. Quem
sabe uma pessoa seja um exemplar de ser humano. Sou uma pessoa.
– Engraçado. –
digo. – Já eu não consigo parar de pensar em ladainha.
Solto um
barulho estranho pela boca. Logo depois, ela também solta barulhinhos
parecidos.
Paro.
O que foi
isso? Isso foi bom.
– Acho que
você riu. – a moça diz. – E eu também ri. Acho que “risada” era algo que curava
o tédio, ou a tristeza. Ou os dois.
– É mesmo. –
digo, impressionado. – Lembro também que risadas eram o que faziam a gente
sentir outra coisa. Um calor esquisito. Ninguém sabia o que era, na verdade,
ninguém sabia definir direito. – olho para o lado. – Despertava um negócio bom
e ruim ao mesmo tempo. Era um negócio “agridoce”.
Está
escurecendo. Agora me recordei que o crepúsculo costumava ser uma coisa linda
de se ver, colorida. Agora não é mais. É uma coisa monótona, porque não há mais
poluição. Aprendi isso faz tempo, mas não sei mais ao certo o que “poluição”
significa. Eu sei que eu sabia o que era, mas não sei o que era. Era um treco
que deixava o céu colorido, só isso que eu sei. Acho que eu não a reconheci
como ser humano porque eu mesmo não mais me reconhecia como humano. Eu entendia
que eu era um humano, mas eu não compreendia o que significava ser humano. E eu
não compreendia mais que eu era um humano porque não havia mais um humano para
quem eu olhar e gerar as definições com base em outro exemplo concreto da mesma
coisa. Deve ser necessário haver pelo menos duas de uma coisa para que essa
coisa realmente exista no campo abstrato. Um é igual a zero... E dois é igual a
infinitas possibilidades?
– Lembrei! –
grito, minha boca fazendo força involuntária pra cima e pros lados, no que
costumava ser “sorriso”. – Risadas
despertavam o tal do “amor”... Amor...
– Amor... – repete.
Não desfizemos
contato ocular ainda. Bizarro demais. Mas é legal.
Amor... O que
era isso? Amor. Amor...
Agora eu sei o
que é.
– Amor. –
dizemos em simultâneo.
Passo
rapidamente a mão pela nuca dela e puxo com força sua cabeça para mim. Nossos
dentes se chocam, mas não importa. Nossas línguas tentam se comer, por algum
motivo, mesmo que essa ação seja a função dos dentes. Do nada, nós dois
morremos.
Morremos?
Não.
Nascemos.
Não.
Renascemos.
Estou
investigando sua boca. Parece que estou em outro lugar bem longe daquele em que
eu estava antes de eu ter puxado violentamente a sua cabeça. Não sei se nos
movemos realmente, porque estou de olhos fechados. Não me lembro de ter fechado
os olhos. Ou será que já escureceu? Não pode, ainda sinto o calorzinho do Sol
iluminando o meu corpo. Os nossos corpos. Ou será que não é o Sol? Estranho,
porque o Sol esquenta a pele, e o que aconteceu é que meu estômago esquentou. É
a fome? Estou comendo? Ah, não, é o coração que está quente. Pulsando. Sangue
correndo pelo corpo.
Coração.
Eu lembro que
isso era uma metáfora para o amor, mas não parece. Não sei como os primeiros
humanos associaram o amor ao coração, sendo que o coração só serve para bombear
sangue e as emoções são coisas intangíveis e não ficam realmente concentradas
num só órgão, porém distribuídas por todo o éter do indivíduo. Sim, compreendo
por que eles associaram o coração com o amor, porque é isso o que estou
sentindo, mas a minha cabeça não consegue entender a conexão entre esses fatos.
A moça afasta os
lábios dos meus, e por coincidência afasto os meus lábios dos dela. Será que
foi coincidência mesmo, ou eu sabia que ela se mexeria, porque ela sabia que eu
sabia que ela se mexeria? Foi bem surreal... Era como se nos entendêssemos.
Como se fôssemos uma coisa só durante aquele beijo. Unos. Será essa a definição
de amor? Tudo se resumir a uma coisa só? Amor é união.
– Humm... –
gemo. – Isso foi bom.
– Sim. – ela
sorri.
Seu rosto é a
coisa mais linda que eu já vi na vida. Certeza. Seu rosto é amor.
Ficamos nos
olhando, procurando vida um no outro através dos portais das pupilas dilatadas.
– Acho que
isso é ser humano. – digo, também sorrindo.
– Sim. – ela
sorri mais. – O ser humano existe para espalhar o amor.
– Sim. E nós
podemos fazer tantas coisas juntos. – digo, com uma felicidade que não cabe em
mim.
Minha
felicidade transborda pelos olhos e pela boca e encontra a felicidade
transbordante da mulher. As duas coisas abstratas se combinam entre nós numa
metáfora poderosa, quando se beijam imaginariamente no ar. Felicidade mais
felicidade é igual a êxtase. Amor é êxtase. Amor é várias coisas, porque dois
representa o infinito. Amor atiça a curiosidade, a criatividade, a alegria, a
humanidade.
– Eu lembro
também que o ser humano gostava de outra coisa também. – digo, bastante
revigorado do tédio que era minha vida. – Além do amor... Tinha outra coisa bem
parecida com isso que era bastante importante, também.
– O que será
que era? – pergunta, curiosa. – Sexo?
– Não, não,
sexo é amor. Digo, amor é sexo. – corrijo-me.
Olho para o
lado e cruzo os braços. Cruzar os braços auxilia a concentração na pesquisa de
memórias, também.
– Lembrei. –
digo, orgulhoso de mim. Isso é a “auto-estima” que eu recuperei. – Os humanos
também gostavam da “morte”.
Automaticamente
a minha mão se ergue e aperta o pescoço minúsculo dela com força. Sem querer,
mas querendo, aperto bem forte mesmo o pescoço dela. Ela não move os olhos.
Cravo meus dedos mais adentro da sua frágil pele, entornando algo roliço que há
dentro da garganta. Está meio escuro, mas a pele dela está bem mais roxa do que
antes. Circulação sanguínea localmente interrompida? Consigo enxergar com mais
clareza agora porque me sinto mais vivo do que nunca. Mais vivo do que num
beijo.
– O amor cega.
– digo, sorrindo. – A morte esclarece.
Ficamos nos
olhando, procurando vida um no outro.
– O amor cria
dúvidas, a morte levanta certezas. – faço um discurso épico. – Nunca me senti
tão bem! – ela nem se esforça para levantar as mãos e tentar tirar a minha mão
do seu pescoço. – A morte é definitiva, é única, é só uma. O amor é um monte de
porcarias abstratas que ninguém entende, tampouco entende ou consegue tocar com
os dedos. O que há de mais concreto do que a morte?
De repente,
seus olhos se arregalam. Sinto que ela sente uma coisa inédita que acabou de
recuperar. Ela sente o medo. Mais precisamente, ela sente o desespero. Eu sei o
que ela está sentindo porque esse é um momento bastante íntimo entre duas
pessoas. Ao contrário do amor, isso daqui é uma coisa só e não pode ser várias.
É quando duas pessoas se tornam uma só, quando, assim como no amor, eternizam
um momento naquele dado instante. Do nada, suas mãos se erguem e freneticamente
começam a bater em mim em qualquer lugar que alcança. Levo bofetadas na face,
unhadas na orelha, chutes na perna, socos no coração, etecetera. Oxigenação
insuficiente?
– Por que
queremos definir tudo? Qual é a verdade da vida? Por que queríamos conhecer a
verdade? Por que queremos conhecer a verdade? – entoo, numa música improvisada.
– Ó, essa é a filosofia osculando a arte! Uma cena linda de se contemplar! Mas
não há pares de olhos e corações para testemunharem esse marco! Que pena! – nas
minhas veias a “poesia” percorre.
Ela não quer
morrer. Ela lembrou tudo o que a vida era. Na iminência da morte, a vida
revive. A pessoa acorda, as coisas passam a fazer sentido. Eu sei disso porque
ela sabe disso. Vejo através de seus olhos. O nome disso é empatia: sentir o
que os outros sentem. Eu nunca estive mais vivo, assim como ela também nunca
esteve mais viva. Ela não consegue respirar, não consegue nem tossir. O que eu
estou espremendo é a sua laringe. Lembrei-me disso da minha infância, das aulas
de ciências. Ela vai morrer. Isso o que eu vejo são as veias dos meus antebraços.
Tão escondidas, porém tão bonitas.
– Ser e estar!
A vida! A vida é ser e estar! Ser o que é, e estar como está! O ser vivo está
vivo! Ser é estar! A vida! Não sei o que é, todavia apenas está sendo! – grito
muito. – Três vivas à vida! Urra! – fecho mais o punho. – Urra! – urro,
exaltado. – Urra! – coloco mais energia nos músculos do meu corpo humano.
Ela vai
morrer.
Eu vou viver!
Vejo nos seus
olhos que ela morreu. Claro que morreu, ela parou de se mexer. Largo o seu cadáver
no asfalto partido com desprezo. A noite caiu. Formigamento? Sim, fiz muita
força. Fadiga muscular. Lembro que preciso me alongar, e lembro que me esqueci
de que eu tinha que ter feito um “aquecimento” antes deste exercício físico.
Agacho-me e pego uma pedra qualquer próxima aos meus pés. Cutuco o corpo com a
ponta afiada. Sangue correndo pelo corpo. Estou me sentindo o máximo. Isso se
chama “poder”. Só que minha barriga dói.
– A verdade da
vida é o poder. – filosofo. – Estou com fome. – estou falando sozinho.
Eu amo ser
humano.