domingo, 30 de dezembro de 2018

Lascas


Apesar de o que me talhou a carne,
O pesar perene nas costas arcadas;
A vida a pisar sempre em mim; Continuo
A pensar que jamais mudarei meu cerne.

Além da autoflagelação que arde,
Alguém me metralhou as costas... Mas nada
Atém-me ao solo, pois eu iço voo –
Assim almejo ficar; no ar e leve.

Ainda que a dor tenha sido extrema,
A ida sem o ardor da decepção
Haveria de ser bem decepcionante:
Eu veria a vida via outra lente.

Não obstante minha chama estar acesa,
Num instante um sopro fraco a faz dançar...
Nem que coloque a mais resistente algema,
Nada é bastante para me segurar.

Diamante fulgura e retém beleza;
Duro, porém frágil; gema metaestável,
Mas que perdura. E quando lapidado
Mais desejável e impressionante se torna.

A vida é o que se passa entre o lapidar e a lápide.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

Efêmero 2


Nós dois éramos uma bolha de sabão:
Leves, coloridos, guiados pelos ventos;
Voávamos no nosso tempo, sem direção.
E, como a bolha, o que tínhamos era tênue.

O estouro espontâneo pareceu explosão,
Nossa história se separou em várias gotículas,
Meu coração se desmanchou sem sua coesão.
Vendo-a esvaecer, chora o ingênuo bebê.



E era uma bolha perfeita, porém efêmera.
Era minha pessoa preferida e se foi.
Ao mundo mostrávamos nossa linda película,
Mas era tudo leve, pois era tudo oco.

Depois de você a vida jamais é a mesma,
Minha melhor parte partiu contigo, se foi...
Meu mundo destruído, uma dor que não finda
Vai me consumindo e aos poucos vou ficando louco.

Cada bolha é um microverso, um verso da vida;
O inverso do universo, que se expande pra dentro;
E não há mais aonde ir quando se chega ao centro.

Assim como o Big Bang, o estouro foi o começo
Dum novo universo, grandioso e incipiente,
Que concebe uma nova realidade inocente.

No vácuo deixado em meu imo vem outro pedaço,
Doado por outro amor, nova possibilidade.
Outra história ganha forma – um conto diferente.

A bolha evolui e me envolve. É gigante e bela.
Sem receio eu me perco nela, em seu vasto espaço.
A brisa me abraça. E eu nunca mais pensei na gente. 

domingo, 16 de dezembro de 2018

Caminho errado


Caminhante errante cansado,
Tudo o que ele faz é errado.
A dor em seu peito apertado
Espessa o ar ao seu redor.

Passado distante passado,
Quando o mundo era colorido.
Sente cada instante espaçado
Demais; o tempo distorcido.


A água salgada de mágoa
Vertida em fluxo constante
Dos olhos vazios, embaçados,
Vergam as costas do caminhante.

A face em estado de repouso
Esqueceu como verga os lábios
Pra cima. Segue cabisbaixo,
Querendo repouso da vida.

Cessa o passo no meio da
Estrada, da rota, da vida;
Autoestima, derrota, dúvida...
E desiste de caminhar.

Sem esperanças, só espera,
Que o acaso decida
Passar, e erguer a descida...
Pois suas pernas se cansaram

Perto do fim.