sábado, 23 de outubro de 2010

Rá-Tim-Bum

Entre, sinta-se à vontade. – assim entra o senhor. – Amor, quem é esse?
É o Sr. Charles.
– Puta que o pariu, o que eu disse sobre o Sr. Charles para você foi em vão? – pergunto. – “Linda, sem Sr. Charles nesta casa. Aquele velho maldito com Alzheimer”.
– Coitado, ele é uma criança. – Linda diz, batendo suavemente no meu ombro.
Todo ano é o mesmo ritual: ligar para a palhaçaria, ligar para o lugar de docinhos, ligar para uma porra de zona pra descobrir o preço do alívio, ligar...
– Paai! Olha o que eu ganhei! – Rhandy diz, puxando a minha manga e esticando os braços para mostrar o presente.
– Filho, atrapalhou o meu pensamento. – digo. – Ah... Que legal, um Max Steel.
– É Barbie! – birra, enquanto cruza os braços e franze a testa. – Barbie é coisa de menina.
Que seja, onde eu estava? Ah, ligar para a distribuidora de salgados e ligar para mais uma infinidade de lugares. O engraçado é que metade desta gentalha eu não conheço. Por causa desses indivíduos, tenho que dar cumprimentos avulsos a pessoas aleatórias. Mais engraçado ainda é que não consigo aproveitar a festa. Eu pago inteiramente o prazer dos outros.
– Amor, só faltam os Connor e os Wederson. – Linda me informa, enquanto desenha um risco horizontal por cima de algum nome, num pedacinho de papel com várias dobras.
Essas duas corjas têm uns pestinhas irritantes. Para ajudar, todos daqui estão famintos e a porra dos salgadinhos ainda não chegou. Pelo menos, o balão gigante com quinquilharias e balas está suspenso no teto... Foi só eu falar que esta merda caiu no chão.
Chego à cena do desastre, no meio da festa, com gente conversando aqui e ali, julgando a minha casa e os meus bens materiais. E a minha incapacidade de fazer tudo certo. Abaixo-me para pegar o objeto inflado de látex cinza-morto. Deu uma vontade de peidar, mas eu não peidei.
– Eles estão ficando irritados por causa dos salgadinhos, Scott. – Linda chega sorrateiramente e me avisa, com os braços cruzados, enquanto eu me estico para pendurar o balão. Do tamanho do meu saco. – O Sr. Charles está chorando, quer o seu pai, tadinho. O pai dele morreu, mas o Alz...
– Se você não percebeu, estou tentando arrumar esta cagada. Mande o Sr. Charles tomar no cu e mande todo mundo tomar no cu. – digo. – Tente arrumar a cagada do salgadinho, ligue para este número. – tiro um papel amassado do bolso e entrego a ela.
Linda pega o papelzinho e começa a desamassar, ao passo que eu me estico para pendurar a droga. Minhas costas estalam e doem pra caralho, Linda lê com uma feição esquisita. Consegui arrumar a bagaça, agora preciso de alguém para arrumar as minhas costas.
– O que é isso? – pergunta. – Donna “Punhetinha” Star, Bella “Bucetinha” Bellini e Ringo “Boquetão” Starr? – ela me encara com a testa crispada. – Venha conhecer as nossas garotas. Somente na boate do diabo você compra três cervejinhas e ganha uma punhetinha.
– Porra! – pego o papel da mão dela num estouro de velocidade e retiro o cheio de marca de dobras, o de salgados, do outro bolso, e entrego. – Ringo Starr é um traveco, não me pergunte o preço. – estou com a mão nas costas. – Faz uma massagem, depois?
Linda enraivece e sai de perto bufando e batendo os pés no chão, fantasiando ser um rinoceronte gordo. Essas drogas de balões, uma maneira de os adultos se divertirem, vendo o desespero das crianças para pegar os doces e bugigangas. Uma arena infantil, pão e circo. Salgados e balões... Pelo jeito, só balões. A campainha toca.
– Paai, tô com fome! – Rhandy puxa a minha manga e choraminga. Junto com ele, uma caterva de crianças vem. Como discípulos do macho alfa.
– Vá reclamar pra sua mãe. – respondo.
– Quero coxinha! – bate o pé no chão, franze a testa e cruza os braços. Faz beicinho odeio.
– Vá reclamar para a porra da sua mãe! – aponto com o indicador para a casa. – Pare de birra, moleque do caralho!
Rhandy sai batendo o pé, como um rinoceronte, à procura da sua progenitora. Só falta correr em quatro apoios para ser o dito animal. Ando em direção à porta de entrada e rezo para que seja a merda da distribuidora de salgados. Uma criança me segue, mas ignoro-a e continuo a caminhar. Chegando lá, abro a porta e me deparo com os Connor.
– Olá, Scott. – saúda Ronny... Ronny o caralho, é Ronald. Não sou íntimo dele.
– Olá... – respondo com certo ar seco.
– Olá, Scott. – aparentemente, os Wederson também vieram. Para isso eles são bons, só vêm para comer e dançar.
– Olá... – digo ao Harold Wederson, que segura o seu filho nojento pelo punho, o Steve.
– Olá, Ronny. – diz o Harold.
– Olá, Harry. – diz o Ronald.
– Amo vocês, caras. – digo aos dois.
Graças a Deus! Graças ao Diabo! Há uma camionete estacionada do outro lado da rua, de alguma distribuidora. Um rapaz sai de dentro dela e vem ao meu encontro. De repente, sinto alguém puxando a parte de trás da minha camisa xadrez suada.
– Tio, onde que é o banheiro? – pergunta-me a criança que me perseguia.
– Olá, Scott. – saúda Elizabeth Connor, que segura o porra-louquinha do Andy.
– É pra lá. – aponto para um lugar aleatório, a fim de me livrar a criança, que agora corre ao “banheiro”.
Não cumprimento Elizabeth e ela me olha com cara azeda, como se eu já não tivesse feito o bastante para abastecer esses filhos da puta. Eles entram e o rapaz da distribuidora está na minha frente, logo que viro a cabeça.
– Olá, aniversário de 4 anos do Rhandy Rhoads... O guitarrista? – pergunta, com um risinho.
– Lógico que não é o guitarrista.
– A festa é aqui, senhor? – diz o jovem, enquanto carrega umas caixas e lê um papel dobrado até o inferno, que retirou do seu bolso.
– É... Porra, são os docinhos! – berro, quando leio “doces” estampado em letra personalizada. “O” é um donuts, “C” é um donuts mordido e o resto não é porra nenhuma. Arranco um tufo de cabelo da cabeça, só para sentir uma dor gostosa.
O jovem me encara com uma expressão de interrogação, e digo que não é nada. Digo obrigado e pago a porra toda. Ele se retira e eu pego as caixas, carrego-as então para dentro. Vou caminhando contra a força peso de toda a porcaria açucarada sobre os meus lindos braços, e Linda vem ao meu encontro, batendo os pés no chão.
– Disseram que a distribuidora pegou fogo. – com a mão na testa. E depois coça as têmporas.
– Só pode ser brincadeira. – os meus joelhos envergam. – Quantos mil docinhos têm nessa merda? – jogo a caixa nas mãos dela e mando colocar na mesa. Pergunta-me “por quê?” e digo para somente fazer isto.
– Rhandy disse que você brigou com ele. – diz, segurando as caixas.
– Ele que não sabe ouvir direito.
– Coitado, ele é uma criança! – franze a testa. – Você está sem cabelo ali. – coloca o dedo na minha cabeça. Não digo nada.
Vou ao meio da conversa, no meio da “festa”. Linda vem junto, entretanto, nossos caminhos divergem. Grito para todos:
– Calem as bocas! – encaram-me com cara de boca calada e cerveja na garganta. – Hoje, todo mundo aqui vai comer docinho até vomitarem brigadeiros! Sem salgados! Entupam o cu dessa merda aí! – pego um punhado de brigadeiros e beijinhos da caixa e atiro na família Wederson, voa um pouco do meu cabelo arrancado neles. – Beijinho, Harold! Beijinho!
E assim inicia-se uma rebelião. Todos gozam da festa e eu gozo de uma raiva imensa. Todos alegres e eu ironicamente alegre... Agora, não tão alegres.
– Vão tomar no cu! Não mandei ninguém vir aqui!
– Onde estou? – Sr. Charles pergunta, perdido no meio do caos.
– No inferno! – retruco. Jogo um punhado de beijinhos e docinhos de uva nele. – Beijinho!
Linda começa a distribuir os docinhos uniformemente na mesa e a me olhar com cara de bunda. Chego perto dela e digo: “O que eu disse sobre os seus parentes foi em vão?”. Sinto alguém puxando a minha camisa. É a criança de antes. Ela não achou o banheiro. Aponto para outro lugar aleatório e ela some. Agora, alguém puxa a manga esquerda.
– Paai, Andy me chamou de piazão de merda!
Puta que o pariu. Pergunto onde ele está e Rhandy me guia. Caminho um pouco mais e avisto Ronald Connor em frente. Chego perto da roda de crianças e vou empurrando, perguntando onde está o bostinha do Andy de merda. Rhandy chora e eu encontro o desgraçadinho, com o seu pai ao lado, rindo. Há um palhaço pedófilo no fundo, o que eu contratei.
– Tá rindo de quê, filho da puta? – afronto Ronny... Ronald, porra.
– É esse, pai. – meu filho aponta para o Andy boca-suja.
Aproximo-me dele e agacho. Ronald diz: “Como é que é?” e eu o mando tomar no cu.
– Escute aqui, pirralhinho de merda, o que foi que você fez ao meu filho? – cara a cara com Andy. Mano à mano, homem à praga.
– Cale a boca, bundão. – levo um tapa na cara. Rhandy começa a puxar a minha gola, dizendo para eu parar com isso, com o rosto todo molhado em lágrimas. Ronald ri e digo a ele: “Pare de rir, palhaço!”. Daí o palhaço colorido papa-anjos pergunta quem o chamou, com aquela voz de idiota querendo fazer graça, o mando tomar no cu.
– Olhe aqui, filho da puta! – direciono-me a Andy, o pivete.
– Pai, pare. – Rhandy continua a puxar a minha gola, me enforcando.
– Pare de falar merda pro meu filho, ok? – balanço o indicador na cara do Andy. – Filho, se aquele palhaço ali passar a mão na sua bunda, me chame, para eu estourar o saco dele. – aponto para o palhaço profissional em palhaçadas, o amarelo e vermelho e branco e azul.
O pestinha ri e cuspe na minha cara. A campainha toca e Rhandy me enforca de vez. Ronald fala para parar e Linda está tentando conter a multidão. As outras crianças gozam de uma festa infantil, com os brinquedos de Rhandy – quebrando os brinquedos dele – e a outra criança perdida do banheiro começa a puxar a minha camisa novamente.
– Quem me xingou de filho da puta? – o palhaço das cores chega e engrossa a voz.
– Para, Rhandy, para! – grito ao meu filho, que começa a chorar. O fundo é composto por campainha e gritos de criança e adultos acriançados. Cheiro de caos. – Ninguém te chamou de filho da puta, mandei você tomar no cu. Então, vá tomar no cu, bozo filho da puta! – soco o palhaço no pau dele. – Vá tomar no cu! – dou um murro no nariz do Andy. – VÁ TOMAR NO CU! – dou um gancho no queixo de Ronald. – VÁ CAGAR NO MATO! – berro ao moleque do banheiro.
Corro para atender a campainha e deixo todo mundo chorando, inclusive Ronald-mandíbula-partida, lavado no sangue do seu filho da-face-afundada. Inclusive as crianças que viram a demonstração de brutalidade, que parasitam os brinquedos de Rhandy, choram insanamente. Indo à porta, Linda corre atrás de mim. Nós dois fazendo um jogging e ela diz que a multidão está um saco. Digo a ela que avisei que estes parentes são uns filhos da puta interesseiros e abro a porta de entrada.
– Olá, gato!
– Porra! O que essa puta está fazendo aqui? – grito com as mãos nas têmporas.
– Quem é essa? – Linda grita comigo e me empurra.
– Bella “Punhetinha” Bellini! – grito com Linda. – Não me empurre, buceta!
– Como você sabe?
– Não sabe, pelo jeito. É “bucetinha”, senhor. – fala Bella.
– Vá tomar no cu! – dou um soco cruzado na cara da puta. – Eu comi ela, Linda. – minha mulher sai correndo e chorando, como uma hiena chorando. – E a merda dos salgados não veio, que piada! – devo ter confundido com o puteiro, que piada.
Ando para dentro de casa e a puta vem atrás de mim, batendo os seus stilettos vermelho-vivos no chão de concreto. Começa a me xingar de tudo e eu a ignoro. Passo pela multidão inconformada e o Sr. Charles aparece na minha frente, perguntando onde está o banheiro. Mando-o tomar no cu e dou um soco na sua barriga. Sinto um cheiro de merda recém-cagada e continuo a andar e a ignorar a meretriz trovejante, que me segue. Começa a chover uma chuva trovejante. Passo no meio da criançada e Ronald tenta dar um soco na minha cara. Abaixo-me e ele acerta Bella, ouço algo quebrando... Nariz? Deve ser a plástica do nariz da puta que acabou de virar uma massa disforme.
Entro em casa, as crianças chorando e Rhandy no colo da sua mãe, com sangue de Andy. Linda diz: “Hora do parabéns, vamos para fora, crianças”, tenta despistar o caos, apaziguar a situação. Apaziguar vestida de sangue. Assim, todos vão para fora e engolem o choro, eu entro mais e vomito ódio. Subo ao Sótão...
...No caminho para fora, indo ao “parabéns pra você, nesta data querida, muitas felicidades...”, encontro a puta e o Connor brigando. Bella vence por nocaute, algo de Ronald quebra. Alguns ainda choram, durante a cantoria.
– Muitos anos de vida! Parabéns, idiota. – disparo à queima-roupa nos peitos artificiais dela. – Odeio palhaços! – estouro o genital do palhaço que geme de dor no chão, com mão no escroto que a criançada mexeu.
“É pique, é pique é piquenique... Rá-Tim...”.
– Bum. – descarrego a espingarda na cara do Charles-chorão, ao mesmo tempo em que cai um raio, acompanhado de um trovão alto pra caralho e um relampâgo claro pra cacete. – Hora do balão, criançada! – estouro a merda cinza e pendurada, cheia de porcarias aleatórias. Carrego a espingarda. Chove lá fora e chove porcarias aleatórias bem abaixo de onde se encontrava o balão. – Quem quer bala?