sábado, 21 de janeiro de 2012

Claustrofobia

Deu para ouvir o barulho de cabeça caindo na grama e rolando o declive nas folhas. E o barulho de metal cortando o ar, um pouco antes disso. Meu coração bate forte sem pausa. E suo. Pedro tenta olhar para fora, entre as cortinas. Quando vou dizer para ele desligar rápido a luz, a luz acaba e também minha voz. Pedro sussurra algum palavrão.
        O silêncio é fatal, apenas ouvem-se os passos na grama do sujeito com a foice, algumas vezes só. E a ventania inconstante. Está completamente escuro aqui dentro. Pela janela, dá apenas para ver a silhueta da lua macabra sufocando-se em parcas nuvens azuis. Não há estrelas. Não consigo enxergar muita coisa além do vulto de Pedro. Não consigo ouvir muita coisa senão o assovio do vento pela fresta da janela. Sinto apenas meus sapatos apertados suados e a cortina esvoaçante nos meus pêlos arrepiados.
        O barulho de passos gradativamente aumenta, em direção à porta da frente, ao lado de Pedro. Pedro corre na ponta dos pés, abaixando o tronco e esbarrando em alguma cadeira. O vulto dele gradativamente aumenta e, quando chega perto o bastante, tenho vontade de abraçá-lo e fechar os olhos com força. Chorar na sua camisa. Ao invés disso, fico imóvel, forçando Pedro a me empurrar com uma calma desesperada para fora da copa. Andamos enganchados e encolhidos por mais alguns metros e a porta da frente se abre. Não hesito em sempre olhar para trás quando posso. E nunca hesito em andar um pouco mais, apesar de estremecendo e me chocando contra coisas.
      Os passos são agora na madeira. A brisa é gelada. A lua escondida. Pedro pára e vê que não tem mais aonde ir. Estamos na cozinha. Minha respiração é cruel e descontrolada, de modo que frequentemente perco a noção da intensidade do meu som. Pedro está olhando para todos os lados com a esperança de um lugar seguro. Ele está com as mãos sobre meu ombro e eu com as mãos tapando minhas orelhas, encarando a porta que nos trouxe para a cozinha, esperando o sujeito desalmado. Perdendo o foco. Estou zonzo e com calor. Sinto os passos calmos chegarem perto a cada segundo. Pedro me puxa para trás da porta, e quando estamos lá puxa levemente a porta para nós, sua mão escorregando na maçaneta fria.
        Os passos cedem perto de nós. Minhas mãos e têmporas latejam de tanto que forço o encontro destes. Pedro também me aperta forte com a unha e força a porta com uma leveza clemente. Embora eu não consiga falar uma palavra, gemidos conseguem escapar da minha boca trêmula. Pedro tapa imediatamente minha boca com a mão que não tenta segurar na maçaneta com força criada. Sinto mais alguns passos de intervalos curtos. Minha boca estava semi-aberta quando Pedro a apertou com sua mão salgada, e assim continua. Mais passos desconcertantes. Tiro as mãos da cabeça e ajudo a puxar a maçaneta. O vento assovia e as cortinas dançam ao fundo. A grama chacoalha, e também as árvores.
        Os passos cederam. Pedro chuta a porta brutalmente. A foice cai no chão junto comigo e Pedro corre, bate a cabeça na parede próxima à porta e derruba umas duas cadeiras na copa, depois de colidir a cintura com a quina da mesa. O homem alto está se levantando. Em quatro apoios, me levanto trôpego, agitando os braços impotentes para não voltar à madeira do chão. Pronuncio o nome do Pedro primeiro como um sussurro falho. O homem está em pé. Na segunda vez em que tento berrar, não muito depois da primeira, o pouco da voz que me sai é gagueira. Na terceira, a cortina se enrosca na minha língua.
        Os passos são mais largos e ligeiros agora. Está ventando muito e muito frio na parte de fora. O primeiro golpe de ar me provoca um calafrio na espinha. Minha voz sai quando eu choro, em nível de diálogo. O breu é integral, não se enxergam as mãos e os pés, então não dá para ter certeza de como faço o que faço. Pedro se debate no milharal, e logo depois entro ali também. O primeiro golpe de mato me deixa mais cego. Quando corro, meu joelho frequentemente dobra-se de fraqueza. O nome do meu amigo só sai gritado quando a tensão é igualmente culminante. Após isso, não paro de chamá-lo. De olhos fechados, minhas lágrimas se espalham pelos milhos. Das muitas vezes e lugares que me corto, meu sangue também se adere às plantações. Mudo de direção quando choco a testa no pneu de um trator, depois de torcer um ou dois punhos. Após isso, não sei mais aonde Pedro vai, dissolve-se no coração meu último conforto. Instintivamente, abro caminho para alguma direção. Não enxergo nada. Depois de correr por mais alguns metros, tropeço em alguma coisa que me parece um corpo e caio com o nariz em alguma coisa viscosa e com um calor fraco que me parece ser sangue demais. Meus braços cedem na primeira vez que tento me impulsionar para cima. Na segunda tentativa, fico em pé e corro o máximo que