Essa não é uma noite comum. Não senhor, não é. É
noite de natal, dia em que todos nos reunimos para comer bastante e receber
presentes. Dia em que a criançada fica excitada e se enche de expectativas,
esperando o santo papai noel chegar, após uma girândola espetacular estourar.
Para quem não sabe, isso daí é coletivo de fogos de artifício. Dentre eles tem
os mais variados, coloridos ou não, barulhentos e retardados. O papai noel
cheira a cachaça ou pinga. A barba dele é falsa, a indumentária dele é falsa, o
sorriso jocoso dele é falso, as lentes dos óculos servem para nenhum propósito,
a bengala dele é ridícula, a dor nas costas dele é exagerada. Enfim, tudo,
menos a barriga, é falso. E os presentes são caros. Custaram não somente
dinheiro, mas paciência e tempo.
A
decoração é divertida de se olhar, porque custou tempo e dinheiro. É engraçado
rir disso, e é engraçado rir da própria risada. Bebendo alguma bebida alcoolizada.
Comendo alguma comida boa e gorda. Mistura tudo no prato e nem sabe mais o que
é o que, fica tudo colorido. Come cores. A música dá indigestão e depressão. Cutuca o
espírito natalino que há
dentro de nós de receber abraços e presentes. E lá vem o nosso sorriso amarelo,
que bonito que é. As piadas são muito bem elaboradas e engraçadas. Espontâneas,
divertidas. Pena que são uma bosta. E eu fico por ranzinza ainda, sendo que a
culpa é da falta de criatividade destes filhos das putas.
Amigo
secreto! Ai, que delícia esse amigo secreto! Ai, o da Joseane é muito especial
e divertido e sempre bem vestido. E ela dá risada quando diz isso. Ninguém viu
que a embalagem tem o formato de um pinto de borracha. Ai, eu já sabia que ela
foi sorteada! Típicas, essas duas! São amigas mesmo! A Joseane é muito amiga
mesmo dessa tal de Daniela! Essa tarada, ninfomaníaca, boqueteira! Ai, como eu
amo essa amizade linda delas! Ai, quanta falsidade no ar que dá vontade até de
comer amendoim colorido e apimentado!
O
Roberto gosta muito do seu amigo secreto. A Roberta quer roubar um beijo da
amiga secreta lésbica dela, e gosta muito dela. O Astolfo ama pudim de leite e
ama receber presentes, e ama amigos secretos, e ama o seu amigo secreto
sorteado, e gosta muito desta pessoa. Ai, esse Astolfo não tem jeito mesmo! He
he he, que engraçadinho esse cara. Esse filho da putinha é engraçado demais.
Toda hora que ele faz uma piada eu tenho até vontade de explodir a minha cabeça
e botar fogo no pinheirinho! Ai, como eu adoro essa gente!
Que
pena que não vou receber presentes. Mas o que vale é a presença de todo mundo e
esse sentimento de confraternização. Eu amo esse clima, mas não tanto quanto eu
amo essa comida e essas porras de bebidas. Adoro ficar encachaçado na ceia de
natal. Vomitar na grama e rolar em cima da droga toda. Olhar as estrelas e
perceber uma estrela cadente passando, que na verdade são meteoritos, fofos
como eu. Dá vontade de me morder inteiro.
Viva!
Viva! Hip hip hurra! Viva! Hey hey hey! Ho ho ho! Viva nós! Viva a gente!
Agora
é hora do papai noel. A criançada está ansiosa pra caralho. Não são muito mais
santas que nós, esses pestinhas interesseiros. Baderneiros imundos cheios de
barro e que choram quando os fogos de artifício pintam no céu. E eu fico
irritado com tanto barulho. Mas, chega a um ponto da embriaguez que você não
consegue ouvir nada direito.
E
lá vem o papai noel falso. Correndo. Agitado. Surpresa, criançada. Pegando fogo
de verdade. Inexplicavelmente. Gritando de agonia. Todo mundo agonizando. Aqueles
gritos incisivos, aquelas pernas bambas, aquele terror generalizado. O
entusiasmo virou em choro. A felicidade virou tristeza. O fogo é apagado com os
presentes, que pegam fogo também. E o corpo carbonizado do papai noel fica
imóvel. O cara virou um objeto de decoração. E aquela música natalina tocando
ao fundo, com aquela apresentação em slides de uma retrospectiva do ano
projetada em uma tela branca. Não sei você, mas eu achei isso muito engraçado.
Feliz
natal, eu amo vocês!
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