quinta-feira, 13 de maio de 2010

Leis do ódio


 Por alguns instantes, o mundo sumiu à minha volta. Embora tenha muita gente - se é que posso chamá-los disso - elas foram anuladas para mim. Um momento de decisão muito séria.

-Como vocês podem notar na apostila, Cambises morreu empalado pela pró...

            As vozes, por mais altas e irritantes que sejam, somem. Simplesmente, somem. E eu aqui, testando cada objeto.
            Pego uma caneta azul do meu estojo e tiro a tampa. Coloco-a na extremidade oposta à que escreve e começo a fazer um pouco de pressão, com a ponta, sobre o braço. Levanto a caneta e abaixo. Sucessivamente. 1, 2, testando, testando.
            Tento depois na coxa. Para cima e para baixo, como um pêndulo, só que deitado. Movimento harmônico simples.
            A caneta não funciona e me riscou todo. Quem sabe o compasso dê.
            Que porcaria esse compasso, quando mais o precisamos, ele some. Como que num estojo pode sumir tanta coi... Droga, acabei de me lembrar que esqueci a porcaria do compasso em casa. Em cima da escrivaninha.
            Quem sabe este pedaço de ferro seja útil.
            Puxo e empurro o tal pedaço, localizado na parte inferior da carteira, onde se deixa a mala e materiais. Um ferro fino e comprido, paralelo a outros cinco. Perpendiculares a outros dois ferros, mais grossos, que ligam pés consecutivos da cadeira. Um ferro grosso na frente, e outro atrás. Ligando os dois pés dianteiros e os dois traseiros, respectivamente.
            Puxo e empurro... Essa droga não vai sair tão facilmente. Melhor eu parar e pensar em algo diferente.

-Quem arrisca um palpite? O vencedor vai ganhar uma bala! Qual o valor de x? Alguém?

            Mas que droga, nem percebi o professor de matemática entrar. O mundo realmente sumiu. Ou ando muito distraído.
            Vou ouvir um pouco de Metal, quem sabe me venha alguma idéia à tona. Peguei meu celular, só falta desenrolar esses fios ridículos dos fones. Estas porcarias sempre se enrolam numa urgência.
            Ok, consegui. Pluga, clica, aplicativos, player, minhas músicas, Metal, Pantera, Walk.
            Ah, o som do caos. Um caos tão lindo. Um caos que nos afugenta deste mundo. Um caos pacífico para meus ouvidos. Muito bom.
            A exatamente 2:41 minutos de música passados, encaro aquele idiota do outro lado da sala. Aquele acéfalo. Primata. Retardado. Escroto. Ele e sua chapinha tosca.
            Eu preciso achar algo bom o suficiente para a tarefa, urgentemente! O intervalo já deve estar chegando e ele parece estar com vontade de mijar.
            Pense rápido John, pense... Pegue o estojo John, e pense, teste mais alguns objetos.
Caneta, não.
Corretivo, sem ponta.
Borracha, sem vértice e mole demais.
Apontador de metal, nem pensar.
Régua de metal... Ótimo.
            É pontuda, mas não o suficiente. Pense John... Já sei, vou amolá-la.
            Caneta, não.
            Corretivo, liso demais.
            Borracha, absolutamente não.
            Apontador de metal... Perfeito.
            Com muito cuidado começo a amolar. Olho para os lados todo momento, não existo para eles. Eles não existem para mim. E logo, aquele emo do outro canto da sala não existirá também.
            O relógio de ponteiro marca exatas 8:56 horas. O intervalo é às 9:00 horas. Uma mijada não passa de 1 minuto. O caminho até o banheiro, andando calmamente, leva uns 30 segundos cronometrados. Para amolar esta régua, tempo indefinido.
            Droga, quase terminando...

- E por hoje é só. Aula que vem tragam este trabalho sobre metais. 30 pontos.

            Cacete, aquele vagabundo está saindo. Amola mais rápido!

-I, olha o maluco ali correndo com uma régua. Que babaca.

            Tenho que correr, seu gordo babaca. Enrolei demais e já se passaram 1:20 minutos desde que aquele otário das calças justas e cabelo alisado saiu da sala. Não está com fio o suficiente mas forçar um pouco deve dar conta do recado. 
            Corra John, corra. Quase lá, ele está lavando as mãos. Corre! Pule! Empale!

-AAAAA! MEU OMBRO! AAAAA! PARE SEU LOUCO! ALGUÉM  CHAME O DIRETOR! SOCORRO!

            Cale a boca, cale a boca.

-CALE A BOCA E MORRA VAGABUNDO!
-O QUE EU FIZ? MINHA BARRIGA!

            Tome, tome, tome! Corta, corta! Sangue, sangue! Rasgue!

-NÃO GOSTA DE CORTAR OS PULSOS SEU EMO VAGABUNDO? TOME!
-AAAAA!

            Merda, cadê a régua? Não acredito que prendeu no punho dele. Pense rápido John... A pia!

-TOME! TOME! LAVE A BOQUINHA!

            Para cima e para baixo. Puxando com força e empurrando com o dobro da força. Puxando x e empurrando 2x. As leis da física em ação.

-PÁRA! PÁ...

            Engula os dentes, engula o sangue.

-ARRUME O CABELO AGORA VIADINHO! ARRUME! CHAME SEUS HOMENS!
           
            Droga, quebrou a pia. Pense, pense... O joelho!

-VOCÊ NÃO VAI MAIS PRECISAR DESSAS PERNAS!

            E agora?? Quebrei. E agora... A privada!!

-QUEM MANDA NÃO PUXAR DESCARGA? AGORA ENGULA!
-JOHN! VOCÊ ESTÁ EXPULSO!

            Droga, o diretor. Droga, não percebi, o cara já morreu na pia. Foi divertido. O doce som da agonia. A doçura do caos. A paz do caos.

-Tchau diretor bundão!
-John! Volte aqui! Afaste-se da janela imediatamente!

            Agora vejo minha vida passando por meus olhos. Ou seja, estou praticamente cego. O chão está ali e não durará mais que 5 segundos e alguns andares. As leis da física em ação...

Nenhum comentário:

Postar um comentário