sábado, 24 de abril de 2010

Meu nome é Tyler


Divorciado, trinta e oito anos. Meu nome é Tyler, gosto de rock e toco em uma banda. Guitarrista de Les Paul. Preferia uma da Gibson, mas resolvi gastar em meu carro confortável e ela que me espere. Raramente sobra algum peido de dinheiro, algum trocadinho para doce, se é que me entende. Minha profissão é ser médico e adoro sangue. Ajudo pessoas que não conheço e nunca ajudaria se não fosse forçado pelo meu instinto ou pela cifra que vai engordando, mesmo que de modo muito desvalorizado. Elas sempre pensam que as amo e que amputaria um membro morto ou abriria uma barriga até de graça se pudesse, mas não é bem assim. Até faria sem remuneração, mas não pelos mesmos motivos que imaginam. Gosto de mantê-los na ilusão e então ter poder do poder. Sempre ando com um bisturi e um estetoscópio no bolso, posso enfartar a qualquer instante – gosto de porcarias gordurosas – e fazer algumas outras coisas que considero banais, não que sejam para o restante do globo.
            Adoro porcarias gordurentas.
Mais um dia qualquer de reclamações e bajulações. Não sou tudo isso que pensam, parem de puxar saco. Rebaixem-me a um patamar baixíssimo, já tenho muitas coisas com que me preocupar. A pensão da minha casa, a pensão da casa da minha ex-mulher, a mensalidade do carro da minha filha, o dinheiro para os traficantes e a poupança secreta para um assassino profissional qualquer que deixa a cena toda limpa.
Raramente sobra algum peido de dinheiro, algum trocadinho para doce, se é que me entende.
Não sou bonito, não sou bom, não sou novo, a única coisa que sou é rico. Pare de encher o saco, conheço barbitúricos e sei manejar muito bem um bisturi, portanto fique quieto. Pare de me engrandecer. Não me superestime, você não é e nunca será amigo meu. Nunca encherá a cara comigo num bar de quinta categoria! Nunca irá a um bordel de quinta categoria comigo, portanto pare de imediato!
               Quando me digo rico, e de fato sou, lembro que sou pobre. Aí é um paradoxo onde o que importa não é a explanação e argumentação sobre a sobressaliência de um dos lados, e sim a resposta de como ambos os lados se sobressaem em simultâneo.
Meu telefone vibra. “Preciso” – se é que me entende – atender mais um dentre as milhões de centenas de telefonemas diários:
– Tyler, vai vencer! – consigo imaginar sua expressão de enraivecida, tão engraçadinha – Não demore, não perdi o telefone daquele advogado!
.Ah, aquele puto. Quero mais é que exploda no inferno. Que o diabo ria e mije na  sua cara. No olho! Torture-o! Imploro! Exoro! Tortura, sangue, uréia e fel!
– Quer saber? Vá se danar! E divirta-se com aquele putano daquele advogado de meia tigela! Se quer dinheiro vá dar a bunda! Garanto que irá faturar mais que eu!
– Como?
Após desligar o telefone na cara, consigo mentalizar a expressão de “que merda?” dela, tão tão hilário. Alguma enfermeira me chama e diz que é “urgente”. Só ouço sangue, machado e “Tyler”.
Quer saber? Estou de saco cheio.
Neste exato momento projeto o telefone que insiste em tocar e fujo do hospital no melhor estilo calmo e puto.
Na minha casa, a cena é minha filha de 16 anos, Keisha, vestida de somente calcinha, com mais quatro marmanjos quaisquer que aparentam ter meus anos de vida. Pego minha escopeta – localizada no sótão, ultra-escondida num lugar ultra-secreto – e explodo a cabeça dos cinco elementos. Pego a BMW de Keisha e me direciono à casa da Amanda. Minha casa, se é que posso chamar disto.
Mesmo com policiais atrás, continuo a 200 km/h e furo o trânsito. Mesmo com policiais atrás, arrebento a fachada da casa daquela vadia e me arrebento. Mesmo com policiais estacionados na frente da casa, cambaleio até o andar de cima, arrebento a porta, e arrebento os corpos daquela vadia e daquele putano advogado, já de roupas vestidas à pressa. Mesmo com policiais subindo a escadaria em passos fulminates, mergulho pela janela e de cabeça, me falta munição...
Foi assim que parei aqui, mamãe, envolto nesta selva de soro e gesso e gaze que não tem fim. A senhora agora volte à Austrália e avise papai que não precisa vestir um terno para vir me visitar. Nem de roupa informal, nem de cueca, nem de calcinha, nem pelado e muito menos despelado. A senhora pode voltar tranquila ao conforto morno e convidativo de sua casa de praia sofisticada e não retorne mais aqui, para o bem do seu pobre coração. Não são todos que alcançaram toda esta oportunidade, se é que me entende. Pegue todo meu dinheiro e venda todos meus bens, aproveite o restante da vida junto ao seu marido da terceira idade e de boa bomba aórtica – vulgo coração. Também ligue pro Robin, 3228-4013, ele canta rock e muito bem. Por favor, se retire, preciso pressionar esta mangueirinha.

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